terça-feira, 23 de julho de 2013

Marivalda e o patrimônio cultural do sertão

Os olhos tranquilos e o sorriso alegre de Marivalda Kariri guardam a cantora de sucesso, que outrora conquistava o Brasil com a canção “Toco cru e sua estória”. Hoje, Marivalda usa o cenário do Sertão Central, tão flagelado pela seca, para transformar a realidade de jovens por meio da arte e preservação da cultura sertaneja. No município de Milhã, localizado a 301 km da capital cearense, Marivalda coordena a Associação Cultural Hugo Pinheiro, que atende 70 jovens da região. Marivalda assumiu a administração em 2009. Neste período, a cantora aumentou as atividades ofertadas pelo projeto, com a criação do Museu e da Casa de Cultura. O museu foi construído na casa que pertencia à tataravó da cantora, restaurada para abrigar o acervo adquirido ao longo dos anos. Segundo ela, a construção representa um importante resgate histórico. “Lá dentro está o pilão, o moinho, os potes d`água, a chaleira de ferro, aquelas coisas que são bem antigas”. O museu também tem peças de arte sacra e 2.500 discos de vinil de diversos ritmos, desde o forró pé-de-serra até os clássicos do rock. A cantora diz que pretende fazer um convênio com faculdades do Ceará, de modo a abrir o museu para pesquisas. A Casa de Cultura forma grupos de atores e coral em dois núcleos, um deles voltado a jovens afrodescendentes. Além dos cursos de canto e teatro, Marivalda adianta que a associação também ofertará aulas de audiovisual e fotografia, em agosto próximo. O mais recente projeto desenvolvido pela Associação Cultural Hugo Pinheiro é o documentário sobre a história de Marivalda Kariri, Messias Holanda, Pedro Bandeira e Zé Manu. “Nós nos consideramos um patrimônio vivo da cultura cearense. Somos os últimos remanescentes do forró pé-de-serra no Ceará”. A produção é dirigida pelos quatro artistas e conta com trabalho do diretor fotográfico Alex Meira. A Forrozeira da Amazônia Marivalda Kariri começou cedo sua carreira artística. Aos oito anos já dava os primeiros passos como cantora no coral da Igreja em Milhã. Com a morte da mãe, morou em um orfanato em Recife onde participou do coral infanto-juvenil até os 14 anos. “Tive muita dificuldade na infância e na adolescência, é uma história meio triste, mas hoje faço dessa história um aprendizado”. Em uma das apresentações na Igreja do orfanato, Marivalda cantou na quermesse para a coroação de Nossa Senhora, que também teve a participação de Jackson do Pandeiro - então, O Rei do Ritmo. Segundo a cantora, no momento em que Jackson a ouviu cantar, quis conhecer a dona da voz “de gente grande” e, em seguida, convenceu a freira a deixá-la subir no caminhão para cantarem juntos. “Foi uma coisa providencial para mim, eu diria que foi meu passaporte para eu ser o que eu sou”. Marivalda considera Jackson seu padrinho no campo artístico e até hoje guarda as palavras do cantor, servindo de motivação para que sempre buscasse seu sonho: “Você perdeu sua mãe, mas Deus te deu seu gogó. Vá para o mundo, vá cantar, vá viver dele”. A cantora conta que pouco viveu em Milhã e quando retornou, seu pai queria que ela se casasse contra sua vontade. Incentivada pelo irmão, pretendia fugir e seguir com a carreira. Mas o casamento a segurou. “A pessoa com quem eu casei era de família boa”, explica. Durante quatro anos, o casal morou numa uma roça distante, em Quixeramobim. Durante esse período, ela juntou dinheiro com a criação de galinhas e ovelhas, possibilitando que se mudasse para Fortaleza com os filhos. De Fortaleza, Marivalda foi para São Paulo, onde deu início à sua carreira como cantora profissional. Embora já cantasse em forrós e casamentos, foi nessa nova fase que surgiu a oportunidade de gravar discos. Outro lugar marcante para a cantora foi a Amazônia. “Foi onde eu fiz o meu pé de meia, me estruturei, criei minha economia financeira. Era uma vida difícil, mas eu sabia que dali eu ia tirar o sustento dos meus filhos e o meu”. Para Marivalda, a Amazônia era uma mina, pois os cantores eram muito bem pagos e ela tinha a preferência dos contratantes. Neste período, a cantora também trabalhou com Luiz Gonzaga. Ao longo da carreira, foram 28 discos lançados. O maior sucesso foi a música “Toco cru pegando fogo”. Lançada durante a ditadura, a canção foi censurada por conta do refrão e fala sobre Rondônia e os povos que habitavam a Amazônia, os quais eram atingidos pelas queimadas. A inspiração da música veio quando Marivalda sobrevoava os garimpos. Quem ENTENDA A NOTÍCIA Marivalda Kariri tem mais de cinco décadas de carreira. Foi uma das primeiras cantoras de forró a veicular a malícia e o humor em suas músicas. Seu maior sucesso foi “Toco cru pegando fogo”. Entre discos de vinil e CDs já gravou 28 álbuns. Fonte Jornal O Povo

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